domingo, 27 de março de 2022

Metáfora

 Em geometria, um tetraedro, também conhecido como pirâmide triangular, é um poliedro composto por quatro faces triangulares, seis arestas retas e quatro cantos de vértice. O tetraedro é o mais simples de todos os poliedros convexos comuns e o único que tem menos de 5 faces. A menor imagem espacial do mundo é o tetraedro, a unidade completa: o uno, o múltiplo, o movimento. Na Filosofia Grega o tripé das virtudes se distribuem na vontade, no amor e na inteligência. No Cristianismo a trindade é representada pelo pai, filho e espírito santo. Nas vertentes "pagãs" o equilíbrio emocional se estabelece entre a mente, o corpo e o espírito. Se as áreas de exatas, humanas e teologia andam juntas, eu não sei, mas que se conectam como pontes, numa interface, assim como a figura do tetraedro, me parece bem possível de ser. 

Simplificar a forma geométrica e dar lhe uma nova nomenclatura, foi a ideia que surgiu a partir de uma brincadeira com as palavras. Se o poliedro tem uma ligeira semelhança com a pirâmide, mas não é e por ventura todos os seus lados são triangulares, surge então a "triâmide", metade triângulo e quase pirâmide! A forma foi concebida a partir de um corte da matriz do meu cubinho de onde surgiram novas possibilidades para criar e alternar a geometria das peças. 

Ilustro a postagem com Colar Metamórfico, nome da coleção de penduradores de parede da Krav Desing, que desenvolveu a peça a partir de resíduos de madeiras prensados. Acolhido por correntes douradas, o pendente ganha a companhia das "triâmides", que são articuladas e se encaixam perfeitamente umas nas outras. Uma metáfora do acessório sobre a vida: o movimento, a união (uno) e a beleza da assimetria (ou imperfeição).



 


domingo, 20 de março de 2022

Águas de Março

 Há um ano finalizava o Projeto de curadoria "Sensações", para o Coletivo Tremma, que tinha como objetivo amenizar o isolamento social causado pela pandemia e estimular no espectador os sentidos, principalmente o visual. Pedi à artista e ilustradora, Emília Simon que selecionasse um desenho que representasse a característica mais marcante em sua arte e ela escolheu a imagem da sereia. Símbolo do nosso folclore e mais antiga ainda na mitologia grega, a sereia evoca mistério, beleza e perigo, tudo que define, atualmente, uma mulher contemporânea. 

 Para apurar o sentido do tato, com a paciência de Jó, do talentoso artista e designer Ricardo Masi, conseguimos confeccionar adesivos e um longo capacho cuja experiência era trafegar sobre ele e identificar os símbolos e imagens das sensações promovidas pelo evento, que foi realizado no Il Caffè, com parceria e gentileza da querida Mariana Jacob. Para o paladar e olfato, foi criado um drink com um gosto peculiar que camuflava seus ingredientes para fazer jus à sua denominação , "Enigmático".

Uma parte do capacho ficou em acervo particular, outra na porta de entrada do meu atelier, no Jardim Potrich @gardenpotrich (na rua 12, nº 12)! Para mim ele é símbolo também das águas de Março que fecham o verão e a promessa de vida em meu coração, quando a canção é sobre as janelas que se fecham para que novos ares e portas possam se abrir. No movimento lento e fugaz da vida, vamos e voltamos, subimos e descemos, caos e cosmos, seguimos, sempre à frente!

Deixo aqui meu convite para uma nova e singela experiência. Um quintal que discretamente cresce, floresce e aos poucos nos presenteia com frutos, um acervo de arte de uma jovem e aprendiz colecionadora, um atelier de artesania brasileira com cerâmicas e joalheria autoral regado à café coado tipo de fazenda e um papo para não se jogar fora, mas guardar dentro da cachola!

Portas e esperanças abertas para um futuro que tem tudo para prosperar! Espero você!









Adesivo "Sereia" e capacho para projeto "Sensações". 
Desenho, "Cesto Guarani" ou "Espada de São Jorge", por Emília Simon.
Joalheria autoral e cerâmicas esmaltadas.






domingo, 13 de março de 2022

A vida é um suspiro

 Aprendi a cozinhar observando primeiro minha mãe, depois minhas avós e só mais tarde me atrevi a fazer  receitas publicadas nos rótulos de cremes de leite, farinhas de trigo e integral, aveias e de outras embalagens afins. Mas o ponto do suspiro ou merengue foi papai quem me ensinou. Ele adorava bater as claras em neve num prato fundo de porcelana e dois grafos justapostos, que para ele era um desafio físico e sua penitência para poder saborear a sobremesa sem culpa. Depois de acrescentadas as colheres de açúcar nas claras em neve, o ponto era a homogeneidade e consistência da mistura, não podia escorrer do grafo até o prato. Nenhum fio. 

Sozinha eu aprendi o segredo de colocar gotinhas de limão para balancear o gosto e o cheiro das claras do ovo, descobri também a temperatura certa para o bem e bom assado da iguaria. O mais curioso desta história é a origem do merengue. Enquanto, alguns historiadores afirmam que veio da Alemanha, pelas mãos de um suíço, outros dizem que foi um polonês que levou a receita à França. Há os que confirmam que sua origem foi pela graciosidade gastronômica dos italianos, cuja hipótese é a que mais me identifico (rs). Outra curiosidade foi o nome de batismo do doce, que foi dado pelo poeta José Galvez Bar, na justificativa de que a sobremesa poderia ser associada ao suspiro de uma mulher, um deleite, um prazer, um orgasmo.

A vida e o orgasmo são mesmo um suspiro: deliciosos, prazerosos e fugazes. Passam assim como um tufão, como canta Lulu Santos: "Tamanha a pressa de chegar, a nenhum lugar, só para ter a sensação, de que a vida passa assim como um tufão". Transformar este tufão em doces lembranças, é que são elas! 

O suspiro, para mim, é memória afetiva. A lembrança das batidas compassadas e estridentes dos garfos sobre o prato de porcelana, o cheiro quente e doce que exalava do forno, a mordida que despedaçava em pedaços a crosta crocante da clara assada com açúcar é uma alquimia que só uma sinapse histórica poderia guardar. 

Em homenagem ao doce realizei a Coleção "Simples Suspiro", em 2018 contemplando a natureza e a brasilidade no ensaio fotográfico com a parceria de Lian Tai. Para este texto, ilustro com o Colar "Cobertura de Cubos" e fecho em madeira talhada por artesão de Trancoso/BA sobre suspiros feitos por mim. 

Estão servidos?


domingo, 6 de março de 2022

Tô de olho!

 Há um antigo ditado que diz: "ser mãe é padecer no Paraíso". 

O ditado é bem claro quando cita 'padecer' no sentido de 'sofrer'. Além da Árvore da Vida e do Conhecimento, há no Paraíso dois rios de lágrimas e tanques de roupas sujas para lavar. E não é só de stress físico que se padece, mas e principalmente, de mental. O filme "A filha perdida" (disponível na Netflix), inspirado no livro de Elena Ferrante, desmistifica a maternidade e expõe um ponto de vista dramático, tenso e quase sempre trágico.

Há um protocolo unanime em ser mãe, mas nem toda mulher está disposta a segui-lo. Somos frágeis, vulneráveis e erramos. Temos desejos incontroláveis e pagamos caro por isso. Quebrar protocolos nos levaram a ocupar importantes cargos, conquistarmos contas bancárias independentes, ousarmos nos decotes e medidas de silicone e adquirirmos o status de "poderosa". Mas... e quando assumimos a maternidade, qual a nossa prioridade real?

Assim como na Natureza, a fêmea se abstêm da própria comida para dar de comer ao filhote. Quando percebe que este não é forte o suficiente para sobreviver na cadeia alimentar ela o abandona ou mesmo o mata, sem remorso. É triste, mas é assim que funciona o mundo animal.  No mundo dos seres humanos, o historiador israelense, Yuval Harari disserta sobre a imaterialidade do dinheiro e define "money is spiritual". Defende a tese de que as relações são feitas através da confiança e o sistema monetário foi criado para validar esta relação de confiança. A relação entre mãe e filhos é mais ou menos assim. Validamos nossa confiança uns nos outros quando encontramos um sentido espiritual, metafísico que nos una e fortaleça nossas relações, nossa árvore da vida, nossa genealogia.

A máxima bíblica, derivada das antigas escrituras hinduístas, profetiza: "aceitar, entregar e confiar", lema diário do instinto materno de plantão. Priorizar este protocolo é o desafio maior da minha geração e das próximas que virão, porque as tentações, os desvios e as distrações estão cada vez mais agressivas e irresistíveis. Não percamos nossas crianças de vista, pois se a vigilia não se dá em tão terna idade, a conta com certeza chegará com multas para quitar.  Lugar de mãe é de olho nas crias!