Incertezas poéticas

"Mar de Incertezas", mostra individual da artista goiana (e minha professora na especialização da FAV/UFG, em 2002), Selma Parreira, na Cerrado Galeria, é pura poesia e dúvida.

A vulnerabilidade, a finitude e a fragilidade da vida numa metáfora visual em tons sóbrios.

Produzida durante a pandemia, a montagem das obras na mostra abraça a leveza abstrata da artista e resgata sua ambivalente característica, a de projetar figuras fora da tela. Nesta mostra, diferente das bacias das lavadeiras e da instalação de sacas de grãos, no Centro Cultural Oscar Niemeyer, em 2018, Parreira traz boias salva-vidas moldadas em barro. Plasticamente atraentes, despertam a incerteza da segurança em terra firme, onde se sustentam, mas quando dentro d'água, afundam como a outra boia de borracha, preenchida com areia, estática no fundo da piscina.

O barro, a meu ver, é matéria orgânica perene, ele quebra, tritura, pulveriza, molha, vira lama e volta a ser barro novamente. Um ciclo constante da matéria ao pó.

Um salva-vidas em meio ao surto do consumo de polietileno. 

A cerâmica preenche o vazio da ansiedade, ajuda no exercício terapêutico para mente, ocupando o tempo, as ideias e as mãos.

Se ela afunda na água, é na água que a cerâmica também se fortalece, se mistura e se recompõe.

A única certeza que temos é aquela sobre a nossa mortalidade, ademais são tentativas e experimentos fugazes diante de tantas dúvidas e possibilidades.

O barro ensina a paciência, a leveza, a dureza e a lei do retorno. 

'Navegar' numa boia salva-vidas é uma metáfora sobre a beleza, a plasticidade, a função e o objetivo da arte, que é devagar num mar de incertezas poéticas e poder abraçar o desconhecido, o lúdico, o cíclico e o efêmero.

"Mar de Incertezas", por Selma Parreira, na Cerrado Galeria