domingo, 23 de junho de 2024

Duelo de instintos

"Temas como machismo, violência sexual e fanatismo religioso não são novidades na 7ª arte. Mas aqui, tais discussões são propostas de maneira crua e extremamente devastadoras (...) Um épico dilacerante". (Kalel Adolfo, crítico de cinema sobre o filme "O Último Duelo", 2021)

A bela Marguerite era uma doce e serena donzela do século XIV. Poliglota, exímia contabilista e dotada doutras virtudes que apenas os homens, naquela época, tinham o direito de expressar. Já estava em vias de se casar, porém, ninguém a sua altura havia se pronunciado. 
Desgraçadamente o império de seu pai foi tomado pelo exército do cavaleiro, Jean Carrouges, um bravo e corajoso guerreiro, que vinha destronando nobres para expandir os ganhos territoriais de sua família, que supostamente seriam seus.
Num interessante e amistoso acordo, Marguerite e Jean se casam e iniciam um meticuloso matrimônio. A polidez e educação refinada dela se opõem à rusticidade e ignorância dele, no entanto, o casal convive com tolerância e diplomacia. Os anos se sucedem e, a nem tão mais donzela, conseguiu ainda conceber herdeiros à família.
Eis que surge um forasteiro, um misterioso galã, letrado em poemas indecentes, atento aos números e às moedas de ouro, Jacques LeGris, um astuto gatuno. LeGris fareja a monotonia e a beleza do jovem casal e, inevitavelmente, interpela a comprometida dama, que de cara ganha sua atenção.
A bela e instruída Senhora Carrouges, carente de uma conversa engajada, aparentemente se deixa convencer pelos galanteios do vertiginoso mancebo. Mas ela não cede aos seus previsíveis encantamentos, ela tem um matrimônio a zelar e sua racionalidade não a trai. Quem a trai são as circunstâncias.
Na ausência do marido, o forasteiro se encoraja em cortejá-la a sós. 
Ela nega
Ele a encurrá-la.
Ela resiste.
Ele a repreende com agressividade, mesmo sabendo que com tempo e paciência, talvez ela ceda.
Mas não há tempo, ele quer agora como um cavalo louco atrás de uma fêmea no cio.
Ela suplica que pare.
Ele a violenta sexualmente.
Ela chora.
Ele continua, embora saiba ler poemas em latim, conheça a beleza sutil das paisagens da Natureza, se vista como um cavalheiro nobre da realeza, saiba as regras de etiqueta com precisão. 
Mas não! 
Ele é um ogro, um monstro, um sádico.
Mesmo, assim sendo, ela milagrosamente engravida.
Seus desejos ocultos pelo algoz são escancarados a uma sociedade retrógrada e machista.
"O Último Duelo" (Ridley Scott) é um filme baseado em fatos reais e relata a história da primeira mulher a assumir publicamente ter sofrido um estupro. 
Este é um filme obrigatório para suscitar mais as discussões que tanto acaloraram o nosso Congresso ultimamente. Os diálogos esmiúçam a fragilidade da ética e moral dos direitos humanos, equiparando a racionalidade humana ao instinto selvagem dos animais, tal como na cena do filme que ilustra esta tênue semelhança primitiva, quando um cavalo garanhão invade o curral para acasalar com uma égua de linhagem. 
A performance "Palomo", da artista paraense Berna Reale ilustra o texto simbolizando a equidade entre homens e animais. A filmagem no centro da cidade de Belém mostra a artista montada num grande e imponente cavalo pintado de vermelho, ela veste roupas pretas e usa uma focinheira como símbolo de silenciamento. As obras de Berna Reale questionam a condição humana diante da desigualdade e da violência.

"Palomo", 2012, obra da artista paraense, Berna Reale 


Cena do filme "O Último Duelo", 2021



 

1 Comentários:

Anonymous Anônimo disse...

Próprio p a época. Realidade triste q enfrentamos. Berna mostra a cena brasileira em relação as mulheres.

23 de junho de 2024 às 10:49  

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