segunda-feira, 22 de dezembro de 2014
quinta-feira, 13 de novembro de 2014
A fotografia na construção da imagem da nação
Expert em história da fotografia, o paulista Boris Kossoy é um
pesquisador incansável e comprovou nos anos de 1976 a efetiva ocorrência de
experiências fotográficas percussoras nas Américas, por Hercules Florence (
1804 -1879), no Brasil e contemporâneas como as realizadas por Louis Jacques
Daguerré (1781 - 1851), na França e por Willian Henry Talbot (1800 - 1877), na
Inglaterra. Dentre um extenso currículo bibliográfico sobre o assunto Kossoy
coordenou e concebeu, no ano de 2012, com direção da antropóloga Lilia Moritz
Schwarcz o livro Um olhar sobre o Brasil,
A fotografia na construção da imagem da nação 1833 - 2003. Num minucioso
estudo e curadoria de fotografias de 170 anos de Brasil, a dupla sintetiza momentos
memoráveis com imagens arrebatadoras do nosso país. Descrevo aqui uma das
reflexões do autor quanto às impressões da nossa baixo auto-estima e um ranço
histórico deixado por nossos colonizadores:
"É fundamental analisarmos criticamente
os processos históricos de dentro para fora, estabelecendo assim os necessários
contrapontos em relação à visões míopes
em relação às 'realidades tropicais', não raro preconceituosas comumente
motivadas pela expectativa do exótico e, como parte do mesmo processo, pela
ânsia de 'documentar' o exotismo nessas terras. Extremamente negativo foi o
efeito do mencionado exotismo ter incorporado em si uma mentalidade racista
algo que comprova pela representação do outro teatralizado pelos pincéis e
lentes europeus."
Kossoy
conceitua seu projeto em duas partes: Regência
e Segundo Reinado (1831-1889) e
República (1889-2003), sendo esta subdividida em décadas de marcos
históricos sócio-políticos e culturais. Dos fotógrafos de importância
internacional e nacional que estão presentes no livro, cito aqui apenas alguns:
Victor Frond, Albert Frisch, Marc Ferrez, Félix Nadar, Augusto Riedel, Vincenzo
Pastore, Pierre Verger, Miguel do Rio Branco, Mario Cravo Neto, Orlando Brito,
Sebastião Salgado, Araquém Alcântara, além do próprio Boris Kossoy. Seu
critério de seleção passou por um crivo crítico sobre a formação da sociedade
brasileira através da fotografia prevalecendo dezenas de imagens antigas
produzidas em estúdio, algumas de importantes datas comemorativas, outras de manifestações
políticas, assim como panorâmicas e paisagens urbanas ou naturais. Seu recorte
temporal auxilia a nossa percepção sobre o início do progresso urbanístico do
país aos contrastes étnicos, das intempéries políticas à retomada da luz.
Sem
dúvida, um livro de imagens para se pensar a história do Brasil, a nossa história,
os nossos antepassados. É como abrir um álbum de família ou relembrar momentos
homéricos da nossa infância, adolescência e, atualmente, da vida adulta. São
imagens como a do piloto Ayrton Senna erguendo a taça no Grande Prêmio Brasil de Fórmula 1, em 1991, pelo fotógrafo Jorge
Araújo, que ascende em nós a chama de uma auto-estima que quer brilhar. A
Agência Autônoma de Filatelia e Numinástica do Governo de San Marino, na Itália
lançou este ano, uma moeda especial de 5 euros com a imagem deste ícone mundial.
Uma homenagem européia aos 20 anos da
morte do brasileiro.
É,
Boris, ainda temos muito o que construir nesta nossa nação!?
A excelência em arte e paisagismo
O
palácio de Versalhes tem fama consolidada pela sua exuberante arquitetura e
decoração, como também pelo paisagismo e avançada engenharia hidráulica de suas
fontes e espelhos d’água. A devoção e ousadia dos “artistas-jardineiros”, como o
queridinho do rei Luiz XIV, André Le Nôtre (arquiteto, paisagista, urbanista e
colecionador de arte), que se dedicou durante anos, exclusivamente às podas e
sofisticação dos labirintos geométricos em uma incansável busca pela perfeição
obteve, ao longo dos tempos, grande sucesso e reconhecimento mundial. A herança
deste talento com a natureza é um legado francês transferido para o Festival
Internacional de Jardins, em Chaumont-sur-Loire, à 200 km de Paris. O castelo,
que foi antiga propriedade da Rainha Maria de Médicis e, atualmente nomeado
pela Unesco Patrimônio Mundial da Humanidade, desde 1992 é uma galeria à céu aberto e ainda abriga obras de arte de renomes
internacionais, no interior de seus cômodos. Dentre elas está "Momento
Fecundo", do brasileiro Henrique Oliveira.
Outra grande presença da arte contemporânea
internacional, no jardim do castelo francês é o artista italiano, Giuseppe
Penone, famoso por suas intervenções na paisagem e em ter seus trabalhos
transformados pela vegetação. Criou, para a comemoração dos 400 anos de Le
Nôtre, 23 esculturas que foram espalhadas nos jardins de Versalhes, ao longo do
eixo do Grande Canal. Penone também está
presente na maior galeria de arte à céu aberto da América Latina, o Instituto
Inhotim. Sua obra "Elevazione", parte da modelagem e conseguinte fundição em bronze de uma
castanheira centenária, à qual outras partes de árvore foram soldadas. A grande
árvore de metal está presa ao chão por pés de aço e, plantadas ao seu lado,
estão cinco outras árvores que, ao longo dos anos, irão crescer e se aproximar
da escultura, como se a sustentassem e criassem um espaço arquitetônico para
abrigá-la. Um diálogo constante de transformação entre arte e natureza.
Idealizado por Bernardo Paz e projetado
pelo paisagista Roberto Burle Marx, o Instituto
Inhotim é um verdadeiro parque botânico e artístico, com programas e
oficinas que beneficiam a pesquisa multidisciplinar entre música, dança, artes
plásticas, jardinagem, botânica, artes cênicas, agronomia e muito mais. Com
galerias de arte espalhadas pelos mais de 8 hectares de jardins, as esculturas
em madeiras ou bancos, do gaúcho Hugo
França são outro espetáculo à parte. Esculpidas a partir de resíduos
florestais, França cria verdadeiras obras de arte ou de design. Sim, elas servem
para um repouso! E ele ainda tem uma produção de móveis residenciais! Sorte
nossa!
O
fascínio que temos ao nos depararmos com a natureza em perfeita harmonia com a
criação artística, seja pelo paisagismo, seja pela intervenção de uma obra de
arte é simplesmente gratificante. A sensação é de estarmos num conto de fadas,
no país das maravilhas, na casa de Edward mãos de tesoura (como bem intitulou a
revista Casa Vogue, do mês
de setembro) é inspirador.
Neste
mesmo mês participei do Earq 2014, evento de arquitetura e design realizado no
Centro Cultural Oscar Niemeyer, em Goiânia, que teve como objetivo um circuito
intenso de palestras. No último dia assisti à fala do paisagista Gilberto Elkis, que explanou em imagens
de alguns de seus trabalhos, a arte e a delícia de trabalhar diretamente com a
natureza. A ciência e a delicadeza de esculpir a planta, encaminhar o curso da
água e desenhar o caminho das pedras.
A
excelência de integrar a vegetação ideal para cada ambiente e realizar um sonho
verde no quintal, na varanda ou no “puxadinho” está no compromisso com a
dedicação, o respeito e o uso consciente dos recursos que a natureza oferece.
Os
jardins verticais ou de Monet, as
pontes sobre espelhos d'água, as quedas d’água ou fontes, as hortas mandalas, o
húmus, os cascalhos, seixos rolados, cascas de eucalipto, bambus, tocos,
tijolos, garrafas pets, britas, pneus, engradados, sapatos velhos, tudo são
recursos para se criar e imaginar um universo de verdes possibilidades. Os
artistas, designers, arquitetos, paisagistas, jardineiros também são
cientistas, médicos, curandeiros. Nada melhor para alma que ter um lugar de paz,
para ser feliz, para se sentir mais humano, mais natural, mais vivo!
Paisagismo
e arte juntos são imprescindíveis para um inesquecível casamento com a
natureza.
Faço
votos que se perpetuem!
quarta-feira, 2 de julho de 2014
Um velhinho muito maluquinho
Um velhinho muito maluquinho
Rockwell
desenhou toda sua vida sendo um homem generoso e desapegado, ainda porque
perdeu muitos trabalhos importantes depois de um grande incêndio em sua
residência. Atualmente suas obras são vendidas à valores significativos e
disputados por colecionadores e celebridades.
Mas
foi a tela The Connoisseur (1962),
cujo tema retratava um conhecedor de arte perplexo diante de uma pintura de
Jackson Pollock (1912-1956), que chamou a atenção ao me recordar de um outro
grande ilustrador, porém brasileiro e ainda vivo: Ziraldo.
O
mineiro, que lançou o livro Zeróis
pela FTD, em 2012 reúne os principais super heróis das Histórias em Quadrinhos
aos grande pintores da História da Arte como Goya, Velásquez, Picasso, Dalí,
Grant Wood e outros.
Antes
disso visitei a mostra Zeróis: Ziraldo na
Tela Grande, no CCBB-RJ, em 2010 e fiquei impressionada com a qualidade
plástica do trabalho somada ao seu sarcástico senso de humor. Numa de suas
telas retrata o super herói Capitão América, "O connoisseur das HQ's", segundo ele, perplexo diante de uma
obra de Roy Lichtenstein (1923-1997). A paródia visual com a obra do ilustrador
Rockwell é simplesmente uma sátira ou uma suspeita homenagem à cultura norte-americana.
Um outro exemplo é a obra Wonder Woman Warhol, onde
trabalha a produção em série como o artista pop Andy Warhol (1928-1987), mas
substitui a maravilhosa Marylin Monroe pela imagem da heroína de mesmo
adjetivo.
Ziraldo
não só esmiúça o domínio cultural que os norte-americanos exercem sobre o mundo
como traz à tona ícones da arte numa visão bem humorada e bastante crítica
sobre a sociedade e seus valores. Principalmente na tela do Superafrodescendente,
onde deixa claro de quais valores se refere quando dá cor negra à pele do imbatível
herói Super Homem e brinca com sua nacionalidade.
"Exemplo de síntese e originalidade o
nome Zeróis já encena por si só todo
propósito do seu criador: Zero, Heróis, Ziraldo", assim define Gessy de
Sales o neologismo do título, resultado divertido do encontro entre famosos
personagens das histórias dos homens, ora heróis, ora artistas.
Como
um eterno menino brincando de desenhar, hoje aos 81 anos de idade, posso dizer
com todo respeito e admiração, que este velhinho será sempre muito, muito
maluquinho mesmo! Viva, Ziraldo! Salve, Brazil!
terça-feira, 10 de junho de 2014
Joias Brasileiras
Se um dia me perguntassem quem foi o primeiro
designer de joias do mundo, eu diria: os homens das cavernas.
O
ser humano tem a fantástica capacidade de desenvolver estratégias de
sobrevivência que lhe facilitam e proporcionam prazer consciente ou instintivo. Ao fazer uso de dentes, ossos, presas,
conchas, couro, pêlos, pedras e outros elementos achados ou adquiridos na
natureza, ele os transformam em patuás, ornamentos de beleza, objeto de
matrimônio, troféus de caça ou exibição de status à sua comunidade. Seja numa
cerimônia aos Deuses, seja num baile imperial, a ornamentação corporal sempre
esteve presente na humanidade.
Tentando traçar um breve histórico
da joalheria, a perita judicial em design de joias, Eliana Gola descreve o
quão importante é delimitar o que é joia
e tentar defini-la. No livro The art and
craft of jewellery, de Janet Fitch, na introdução sobre o tema fica clara
essa definição, onde cita que "a história convencional da joalheria é
narrada a partir do ouro, prata e pedras preciosas, numa sucessão de colares,
cetros, coroas e tiaras fabricadas para reis e rainhas. Porém existe outra, uma
história paralela sobre antigos objetos decorativos de amplos grupos espalhados
pelo mundo à fora. Nação, costume, etnia e joalheria de design moderno são
partes desta história alternativa, onde o ornamento não obedecia regras."
Assim
como hoje existem designers que utilizam materiais alternativos em suas peças,
antigamente os primatas já o faziam. Quando digo, materiais alternativos me
refiro à algo que saia do padrão tradicional da joalheria como as pedras não
polidas, pele, chifres, cerâmicas, penas, fibras, madeira, etc. Ao investigarmos
a cultura dos povos da antiguidade, seus adornos, adereços de adoração,
emblemas e significados nos surpreendemos com a qualidade e ousadia de criação
de nossos antepassados.
Tal
qual uma joia de metal precioso, a arte plumária dos indígenas brasileiros, com
sua minuciosa confecção manual, exuberância estética entre cores e equilíbrio
simétrico, assim como a raridade das espécies capturadas (visto que atualmente
a fauna e flora regram por grande proteção ambiental) possui altíssimo valor de
mercado. "Se compararmos a arte européia e a arte indígena, veremos que,
se na Europa começava o interesse pela botânica e floricultura, manifesto na
joalheria, os índios brasileiros sempre a tiveram como inspiração." Eliana
Gola também classifica valiosa a diversidade e excelência de pinturas corporais
de algumas tribos, contando que elas também fazem parte do ornamento físico e
tem grande importância simbólica para os rituais.
A partir da descoberta do ouro no
Brasil, no século XVII, principalmente em Minas Gerais a corrida pelo metal faz
antecipar uma popularidade internacional, resultando no que Gilberto Freyre
descreveria de "caldeirão cultural". Os ourives, que antes vinham de
Portugal, agora eram os ditos "impuros", mestiços, ou brasileiros que
se dedicavam à profissão utilizando técnicas e sabedoria de seus antepassados. Misturando
uma série de materiais alternativos como contas de castanhas, pau-brasil, ossos
ou presas de animais nativos, dá-se aí o início de uma identidade nacional,
baseada nas crendices populares, miscigenação, elementos resgatados na natureza
e motivos da brasilidade.
Assim
como os indígenas, os africanos ou a realeza européia, a corte brasileira
também desfilava seu status e poder nas festas através de suas joias e pedras
preciosas, mas com um pequeno detalhe, suas escravas também tinham de usá-las.
As conhecidas joias de crioulas eram confeccionadas exclusivamente para essas
escravas. São assim chamadas porque eram criadas dentro do ambiente da nobreza,
isto é, dentro da casa-grande e não na senzala. As amas de leite, ou afilhadas,
até mesmo as amantes dos senhores possuíam suas próprias joias. Atualmente,
seria como possuir um carro de luxo e o exibir à sociedade, quanto mais riqueza
tivesse mais joias se adornaria a crioula.
Com o passar do tempo e o
enfraquecimento da política de escravidão as próprias escravas compravam sua
alforria com suas joias. Os adornos englobavam uma mistura de temas da
joalheria portuguesa com a africana, fortemente manifestada por motivos
religiosos ou profanos. São conhecidas as peças que incluem ébano, búzios,
piaçaba, corais, marfins e cristais. Laura Cunha editou um livro de imagens e
história das Joias de Crioula, onde fez uma maravilhosa seleção de peças,
principalmente dos famosos balangandãs. Num conjunto harmônico de pingentes, o
balangandã era peça fundamental na ornamentação da crioula. Cada pingente tinha
seu significado, sua simbologia litúrgica ou sua função de proteção. Também
eram peças barulhentas, visto que presas aos tornozelos ou cinturas informavam
o local exato das escravas.
A história da joalheria brasileira
ainda é pouco explorada, porém muito valiosa. Não por acaso, um dos raros
mantos tupinambás está num museu da Dinamarca. Peças em cerâmica, de índios
Carajás ou marajoaras, cocares elaborados com espécies de pássaros já extintos,
ou estão nas mãos de meticulosos colecionadores ou em instituições estrangeiras.
Nosso legado como designers é o de acrescentar às gerações próximas a nossa
verdadeira herança cultural. Seja pelo desenvolvimento de novas técnicas, seja
no resgate de nossas raízes. Façamos assim um inesquecível casamento entre o
passado e o futuro!
segunda-feira, 19 de maio de 2014
quarta-feira, 16 de abril de 2014
Bahia de todos os dons
Bahia de todos os dons!
"Não existe tela branca nos
trópicos. É como se tudo fosse atravessado pela cor."
A frase é do artista paulista Luiz
Zerbini, em entrevista à Folha de SP ," que viu isso com clareza numa
viagem com as filhas para o sul da Bahia. Sua idéia era criar ali um diário do
que acontecia, mas ficou tão estarrecido ao ver os tons da paisagem e dos
bichos, que nada escreveu."
O deslumbramento de Zerbini faz jus
à região. Um lugar esculpido pela natureza e nos presenteado como uma obra de
arte viva e pulsante. Foi berço caloroso para diversas manifestações populares dentre
elas a capoeira, o afoxé, o acarajé e o candomblé.
Nos
dons das palavras são célebres poetas e escritores da literatura brasileira
Gregório de Mattos, Castro Alves e Jorge Amado.
Nos dons dos sons, a Bahia foi "progenitora"
do Tropicalismo, movimento cultural
que mais se intensificou na música reafirmando o talento dos jovens baianos
Gilberto Gil, Caetano Veloso e Tom Zé.
Nos dons das artes visuais foram
pioneiros na renovação das artes plásticas baiana os filhos de orixás e
desbravadores dos emblemas da religiosidade yorubá, Rubem Valentim, Mario Cravo
Júnior e Carlos Bastos. O artista baiano, Deoscóredes Maximiliano dos Santos, o Mestre Didi foi além da bidimensão
e convenções estruturais. Concebeu esculturas-objetos ou artefatos de adoração
num entrelaçado de varas de bambu ornamentados com búzios e outros aviamentos
da brasilidade. Talvez, por uma ironia do destino, foi pelos tons do artista argentino Hector
Julio Páride Bernabó, apelidado como Carybé (do tupi, pequeno peixe amazônico)
que mais se difundiu visualmente a cultura baiana, no Brasil e no exterior.
Carybé dedicou toda sua produção artística nos temas da baianidade e recebeu
título de Doutor Causa Honoris pela
Universidade Federal da Bahia. Me foi dito ainda, pelos arredores do MAM/BA, em
Salvador, que o concederam a cidadania baiana em gratidão à sua incansável
pesquisa cultural. O contemporâneo, Marepe, Marcos Reis Peixoto desenvolve sua
pesquisa no mote dos objetos do cotidiano e, a relevância de sua obra é tanta,
que o Instituto Inhotim abriga em seu acervo pelo menos cinco delas.
Descrever toda essa energia de dons da terra da alegria é
um desafio, mas a Bahia deu sua graça na presença feminina e caracterizou a cultura
do país no estrangeiro. A pequena
notável, Carmem Miranda com sua euforia contagiante, seus exagerados adornos,
fitas, laços, frutas e toda sorte de apetrechos encantou, cantou e contou pro
mundo "o que é que a baiana tem."
Cito também, por conhecimento
pessoal, a fantástica companhia de dança contemporânea baiana, a Dance Brazil Foundation. Encabeçada por Jelon Vieira, as coreografias interagem
balé clássico, movimentos da capoeira e danças folclóricas, no entanto
restringem suas apresentações à Salvador e Nova Iorque.
Encontramos mais arte e talento nos roteiros dos longas, Cidade Baixa e Ó, Pai, Ó!, estreados pelos baianos Wagner Moura e Lázaro Ramos, onde
a realidade brasileira demonstrada é ora atônita e cruel, ora bela e feliz.
Assim
vem se formando um povo de muitos dons inspirados pela natureza e guiados pela
fé. Axé, Oxalá, Saravá!
TATIANA POTRICH
terça-feira, 15 de abril de 2014
segunda-feira, 24 de março de 2014
Joias, Champagne e Luxo para todos
JÓIAS,
CHAMPAGNE E LUXO PARA TODOS
O maior concurso de jóias do
mundo realizado pela AngloGold Ashanti
promoveu, em 2006, uma videoconferência com transmissão para mais de oito
capitais do país, onde estive presente,
em Brasília. A videoconferência foi ministrada por várias entidades, dentre
elas o presidente da mineradora e a dupla de designers brasileiros Humberto e
Fernando Campana. A palestra se deu entre imagens avassaladoras do Brasil como o
Carnaval, as favelas, os aterros sanitários, o artesanato popular e os camelódromos, as praias e as mulheres, a biodiversidade e finalmente as
contradições sociais de um país tão grande e diversificado. O objetivo foi
instigar o grupo de ouvintes a uma investigação minuciosa de nossas origens e a
capacidade de organização das imagens e idéias à pesquisa do produto final,
isto é a jóia conceitual. Este foi meu primeiro encontro indireto com a dupla,
que esplendorosamente nos deixou uma mensagem muito sincera, o inusitado se
encontra nas coisas mais simples.
No
ano de 2010 finalmente os conheci pessoalmente no lançamento do livro Complete Works Campana Brothers (so far),
numa loja de decorações em Goiânia. A mostra de design trouxe alguns dos
mobiliários da dupla, como a linha de cadeiras Sushi e, claro a presença dos designers para a noite de autógrafos.
Simpáticos e pacientes, Fernando e Humberto curtiram a tietagem goiana e nos
contemplaram num encontro com a magnitude do design brasileiro que foi e é
reconhecido e premiado mundialmente. Desde o mais experiente profissional ao
mais curioso e inocente convidado, as formas, cores e materiais atraíram os
olhares e atenções, isso porque suas obras transcendem as fronteiras entre arte
e design. Eles ignoram todas as convenções do design tradicional, brincam com a
noção de funcionalidade e formam seus objetos poéticos a partir de realidades
contraditórias.
Humberto queria ser índio.
Fernando astronauta. Os irmãos faziam os próprios brinquedos desde crianças e a
infância no campo foi determinante em seu trabalho. Conta Humberto, em
entrevista à Revista Casa Claudia
que, “... a gente queria fazer uma fusão entre caipira e urbano (...). Vivemos
num país naif, caótico, colorido e,
logo percebemos que teríamos que trabalhar com a imperfeição.”
Uma
dessas imperfeições foi parar no Hotel Du
Marc, na França. “La Gloriette”
dos Campana foi feita sob medida para
a Veuve Clicquot. Nos antigos
palácios europeus, desde o século XII e hoje, em espaços que possuem áreas para
jardinagem, a edificação gloriette (gloire do francês que significa pequeno
cômodo) é muito apreciada por moradores e visitantes. Situada em local alto de
destaque a obra é um misto de técnicas arrojadas e do romantismo do século XIX,
num moderno gazebo que simula o crescimento das vinhas. Sua cor faz alusão às
folhagens dos vinhedos e principalmente ao rótulo do champagne mais desejado do
mundo.
O luxo
de suas criações vai além do mobiliário. Os Campana em parceria com a joalheria
H.Stern criaram uma coleção
formidavelmente criativa e inusitada. Movimentos, articulações e originalidade
são um dos adjetivos das jóias que mais se parecem obras de arte. Inspirado nas
madeirites, nos papelões de embalagem, tubos plásticos, cordas, ralos, casulos
e texturas orgânicas a dupla nos surpreendem quando integra o rústico à técnica
da ourivesaria. Roberto Stern, em prefácio do catálogo Campana descreve: “São ousadas, uma ruptura com o tradicional e um
passo adiante em tudo que é feito atualmente em joalheria. O resultado foi
registrado neste catálogo pelo olho mágico do fotógrafo suíço Michel Comte.
Ninguém mais sensível do que ele, que divide seu tempo entre fotos de
celebridades e de guerras, para interpretar um trabalho nascido de contrastes.”
Mas não só os nobres têm acesso
aos produtos Campana. A marca Melissa
lançou uma linha de sapatilhas e bolsas assinadas pela dupla. Também foram
convidados pela grife francesa Lacoste
para inventar, brincar e adestrar seus lindos jacarezinhos. É verdade que
algumas peças tiveram edições super limitadas, contudo os designers também
formataram suas embalagens exclusivas, em palha e lona.
Em comemoração aos 150 anos do
Grupo Monte-Carlo SBM, a dupla abriu a mostra Dangerous Luxury que foi até o dia 20 de julho deste ano, no Salão
Sporting d’Hiver, em Mônaco, onde interrogou o público acerca do conceito do
luxo e sobre como um objeto popular ou do cotidiano pode se transformar em
objeto de luxo.
Simples
e sensíveis estes sonhadores transformam o lixo em luxo, o rústico em
sofisticado, o artesanal em larga escala. Adeptos à sustentabilidade e trabalhando
pela “humanização do design”, tem como prioridade o respeito ao meio ambiente e
a natureza. Carinhosamente relembram a infância na cidade de Brotas, em São
Paulo e guardam lembranças de histórias e feitos, como a primeira casa na
árvore. Enquanto Humberto cria seus objetos como um artesão e artista
autodidata, Fernando participa como um arquiteto experiente. Uma união perfeita
entre familiaridade e profissionalismo.
Um casamento que realmente nos enchem os olhos e a alma! Vida longa ao talento
desta dupla brasileira!
TATIANA POTRICH