domingo, 14 de janeiro de 2024

Tiozêra

Inúmeras foram as reformas e reinaugurações do Centro Octo Marques, antigo Museu de Arte Contemporânea, no icônico Edifício Pathernon Center. Uma delas, em especial, marcou minha experiência a exposições de arte por lá: a inauguração da mostra "Grandes Tristezas", do artista mineiro Farnese de Andrade. 
A tão esperada e famosa coleção particular de Sebastião Aires de Abreu finalmente seria exposta ao público goiano, em 2002. Tião, generosamente, abriu seu 'porão' e escancarou a verdade oculta de seus desejos, prazeres, angústias, horrores e medos.
Como narrativa emblemática de um tema sombrio e mórbido, a obra do mineiro nos conquista pela arqueologia criativa, sensibilidade e beleza estética de objetos que parecem ter saído de antológicos pesadelos, ou impressões litúrgicas premonitórias.
Além de sinistras, as obras são críticas, astutas, audazes e perceptivas, obras que transitam entre o orgânico (material) e o espiritual (imaterial). Obras que desnudam seu colecionador até o último fio de cabelo, cujo impacto de suas imagens foi literalmente tatuado nas costas deste excêntrico mecenas, que também 'acumula' dezenas de obras do goiano Siron Franco, em seu 'porão'.
Já dizia Carl Jung:
Qualquer árvore que queira tocar os céus, precisa ter raízes tão profundas a ponto de tocar os infernos.
Tião vem fazendo esta ginástica, se esticando entre os 'quintos dos enfermos' ao Paraíso. Constrói essa ponte dicotômica com uma diplomacia exótica e democrática.
Expande sua coleção e investe em talentos goianos com vigor e fé.
Invoca a feminilidade e afetividade em sua coleção através das delicadas mãos de uma mulher negra, porém numa pegada mais kitsch e povera, de outra mulher, ironiza a sociedade de consumo.
Absorve a tensão de síndromes psíquicas, como a de alguns artistas bipolares e suas transgressões e rebeldias, no entanto ameniza essa estética com a lógica e a razão de formas geométricas que se multiplicam através do jogo de luz e sombras.
Tião tem uma coleção sóbria, lúcida e cuidadosamente seleciona sempre o que vai compor suas paredes, seu centro de sala, seu sagrado louvor profano à Arte.
Não nos cabe julgar, rotular ou pré-dizer sandices, escrevo do punho da criança que voou de helicóptero pela primeira vez e viu, num lindo dia de Sol, o quanto somos pequeninos lá de cima, no céu azul.
Foi um passeio inesquecível, quando ainda chamava Tião, o Tiãozêra, de "tio", "tiozêra". Foi só depois de comer muito feijão e experimentar muitas loucuras desta vida, que hoje, a criança crescida o considera um amigo, um tio descolado, um quase agregado na família Potrich, né não!?
O texto foi para parabenizar este 'Sinhõ', que completou mais uma volta em torno do Sol e comemorou em grande estilo seu aniversário na Cerrado Galeria, com a mostra "Um Mundo Próprio", pela curadoria de Divino Sobral. Continue rodando o mundo, Tião.
Muita saúde pra ti
imagem do instagram @tiaoabreu
"De olho até onde a Arte me leva... empresto e compartilho todo azul que posso ser" 
Ieda Jardim
imagem do instagram de @ieda_jardim

 

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