domingo, 8 de outubro de 2023

Os rapazes do Renka

 Na contramão da tendência do mercado contemporâneo, eis que um coletivo surpreendentemente arrebata a cena artística e distorce o discurso "modista" para resgatar lá de dentro do útero a arte produzida por rapazes crescidos. "Individualidades Simultâneas" é a mostra na Vila Cora Coralina do coletivo RENKA formado por Ebert Calaça, Douglas Dojla, Mateus Dutra, Danilo Itty, André Morbek, Renato Reno e a convite da turma, o escultor Divino Diesel. Composto exclusivamente por homens, que há 5 anos frequentam o mesmo ateliê em trocas coletivas e produções individuais, toparam o desafio de sair da "toca" para dar a cara a tapa ao público goiano. Bastante fluentes na linguagem urbana, popular e regional, cada artista produz com sua característica, técnica e pesquisa própria, no entanto, o que mais chamou minha atenção foi a harmonia estética e a nostálgica reminiscência infantil. Ali, naquele generoso salão de exposição, pude presenciar uma atmosfera feliz, feminina, familiar e, ao mesmo tempo transgressora, rebelde e crítica, como as Artes Visuais tem de ser. 

A expansão do grafite que invadiu as paredes da instituição é um dos sintomas desta revelia (não no mal sentido), mas com um olhar inverso para este movimento artístico. O espaço urbano que adentra o particular para finalmente atingir seu real propósito, atrair os olhares do espectador às "flores" que nascem nas fendas do asfalto. A arte urbana é o termômetro da sociedade, ela é quem grita nas ruas como anda a violência, a desigualdade social e o desrespeito ao Meio Ambiente. 

A empatia entre as 100 obras expostas, a meu ver, ganha notoriedade ao enaltecer a feminilidade: seja na boca ou nos olhares sensualizados e não "fotoxopados", de Dojla; sejam nas bocas abertas de afiados caninos das feras adornadas com estrelas, de Itty; ou nos corpos nus das mulheres de Calaça, que se "camuflam" também de feras; sejam nas asas e nos peitos dos macacos ou macacas, assim como no castelo de ouro, de Reno; ou mesmo na pintura estilizada ou estereotipada de Dutra, que optou pela paleta cor-de-rosa "estilo Barbie" e; por fim, os mosaicos de Morbek, que encobrem silhuetas femininas com ranhuras de ponta de prego na superfície da tela.

Sim, podem dizer que estou "viajando", mas a arte não é para isso?! Para tirarmos o pé da realidade e expor um ponto de vista que nos permita respirar um ar mais onírico, mais humano, mais afetivo da vida!

 A imersão do coletivo para a produção desta mostra deixou claro a forte correnteza pela qual todos atravessaram, expondo sentimentos da infância, traumas, superações e inevitavelmente a relação materna, seja pela avó, mãe, namorada, amante, esposa ou filha. O arquétipo da Terra Mãe, Pacha Mama, Gaia, a Mãe Natureza.

Ficou evidente, pelo menos para mim, como a força de tanta testosterona reunida conseguiu abraçar carinhosamente a ardilosa fragilidade do sexo oposto, aquele que gera e cuida. Senti, que em meio a tantos contratempos, correntezas, correrias e contramãos, a criança interna que habita em cada um dos artistas, caminha e nada por aí em águas bravias, sem medo de se afogar e nem de se arriscar, mas literalmente riscando.

É isso aí, rapazes, a braçada tá forte. Continuem nadando!

Fachada pelo RENKA: Dojla, Calaça, Itty, Morbek e Dutra


"Tempos de Menino", por Reno, na Vila Cora Coralina


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