Famiglia
Papai sofre de um tipo de anemia crônica que só se reestabelece com a transfusão de sangue ou ferritina na veia. Sua origem pode ter diversas vertentes como a genética, sintomas emocionais relacionados à co-dependência narcisista, ou características de cunho espirituais, como ilustra bem os contos de vampiro, que só sobrevive se alimentando de sangue. Inconsolavelmente comovida, decidi doar sangue para um dos maiores centros clínicos de Goiânia, como ato de compaixão ao meu pai e a tantos outros que necessitam de transfusão.
Descobri que fazer doação pode
não ser tão simples assim! Primeiro você precisa passar por uma triagem sobre a
data e prazo de suas vacinas e tatuagens além de estar com o peso acima de
60kg. Se você passou este teste, tem mais algumas 100 perguntas que você deve
responder num ping pong. Este foi o desafio mais íntimo que tive depois
da gravidez e da terapia: “Você transou de camisinha nos últimos 6 meses?
Você tem parceiro fixo? Você tem ou teve câncer, fez cirurgia, teve diarreia na semana passada, covid, dengue, tem filhos, abortos, está menstruada?... ‘paga
suas contas em dia’?” (só pra distrair) Quase desisti de doar meu precioso e
caro (uma bolsa de sangue pode custar de 500 a 20 mil reais!). Mas, por fim consegui
encher uma bolsa de 450ml mesmo com os olhares desconfiados da enfermeira sob a
queloide acima da minha veia, que ela provavelmente pensou serem excessivas sessões de doação, mas que (em verdade), foi um intensivo tratamento de auto-hemoterapia. Há de se registrar também os cuidados pós doação como evitar exercícios físicos, carregar peso, se alimentar e beber bastante líquido, além de eventuais efeitos como hematoma, queda de pressão, febre, desmaios, tonturas, mal estar, náuseas e vômitos. (Tô achando o valor da bolsa de sangue justo!)
Vampiros ou não, estamos
conectados internamente pelo mesmo líquido vermelho. O sangue rege uma
orquestra perfeita dentro de nosso corpo frágil, vulnerável e mortal. Descobri
meu ponto fraco estudando as fragilidades da anemia. Felizmente não sofro desta
fraqueza, mas toda tensão emocional desaba sobre meus dentes e gengiva. Sofro
de uma obsessiva vigília familiar, onde me encarrego de entender e me
responsabilizar pelas decisões dos meus entes queridos. O bruxismo pode ser um
aspecto de negação dos sentimentos hostis e a necessidade de controle das situações, daí o ranger dos dentes e retração da
gengiva.
Cada um tem que assumir seu papel
e tomar consciência de das causas e efeitos. Diria a criança que aprende um refrão:
“Ema, ema, ema, cada um com seus problema” e sigamos o plano.
Geneticamente interligados, numa teia, numa veia de ligamentos que nos conecta
e converge para situações extremas, extensas e extraordinárias, somos todos
fadados ao fim, ao falecer dos órgãos, dos ossos, dos dentes. Tudo que começa,
termina e recomeça num novo ciclo.
E viva a famiglia!
Ilustra o texto minha tia, irmã
de papai que fundou sua galeria de arte com o apoio da nossa família. Mara
Dolzan vive e mora em Campo Grande, cuja galeria de mesmo nome
atua no mercado há mais de 40 anos. Gaúcha de nascença, recebeu título de
cidadã sul-mato-grossense por contribuir com a cultura e a arte no Estado.
Minha tia posa com o anel “Cubo Mágico” feito sob medida.
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